A doença, potencialmente letal e infecciosa, pode ser prevenida por meio de vacinação.
Publicado no fim de fevereiro no periódico Critical Care Science, um estudo do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), realizado em 16 hospitais do Rio de Janeiro, acendeu um sinal de alerta sobre o tratamento da meningite pneumocócica, uma das formas mais graves da doença. O estudo analisou 411 amostras da bactéria Streptococcus pneumoniae, principal causadora da meningite bacteriana em adultos e crianças, e revelou que 14% delas são resistentes à ceftriaxona — antibiótico de primeira linha muito utilizado no tratamento da meningite.
A pesquisa avaliou amostras coletadas entre 2021 e 2023, com o objetivo de mapear a prevalência de pneumococos resistentes a antimicrobianos no ambiente hospitalar. As descobertas preocupam especialistas e chegam em um momento estratégico: em abril, a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou suas primeiras diretrizes globais para o enfrentamento da meningite, com foco em acelerar o diagnóstico, garantir tratamento oportuno e melhorar os cuidados de longo prazo.
Uma doença letal e infecciosa
A meningite bacteriana, embora tenha tratamento e vacinas eficazes, ainda é uma das formas mais letais da doença, podendo levar à morte em menos de 24 horas. Segundo a OMS, em 2019 foram registrados 1,6 milhão de casos de meningite bacteriana no mundo, com 240 mil mortes — uma a cada seis infectados. Além da alta letalidade, cerca de 20% dos sobreviventes enfrentam sequelas duradouras, como perda auditiva, dificuldades motoras e cognitivas, e paralisia cerebral.
“A meningite pneumocócica não é a forma mais contagiosa da doença, que é a meningocócica, mas o Streptococcus pneumoniae pode ser transmitido por gotículas respiratórias e resultar em colonização assintomática, especialmente em crianças, que podem transmitir o patógeno a idosos ou imunossuprimidos. Casos de meningite em ambiente hospitalar ou domiciliar podem gerar surtos, especialmente em locais de aglomeração, como asilos e creches”, alerta o Dr. Pedro Peloso, primeiro autor do estudo e Doutor em Ciências Médicas do IDOR.
Resistência a antibióticos é ponto-chave no combate à doença
No estudo conduzido no Rio de Janeiro, além da resistência à ceftriaxona, as análises laboratoriais também mostraram que 29% dos isolados apresentavam resistência à penicilina — outro antibiótico amplamente utilizado nos tratamentos. Em casos de pneumonia e outras infecções pneumocócicas, observou-se ainda resistência relevante a ampicilina (22%) e sulfametoxazol-trimetoprima (26%). Por outro lado, não foi detectada resistência à vancomicina, linezolida ou teicoplanina, antibióticos considerados como última linha de defesa.
“Os dados de resistência bacteriana são fundamentais para a saúde pública, pois previnem falhas terapêuticas e guiam políticas públicas e campanhas de vacinação. A resistência a antibióticos de primeira linha, como a ceftriaxona, pode levar ao agravamento rápido do quadro clínico, especialmente em infecções graves como a meningite. A vigilância da resistência associada a sorotipos de Streptococcus pneumoniae ajuda na avaliação da efetividade das vacinas pneumocócicas e orienta eventuais atualizações nos imunizantes”, acrescenta o Dr. Peloso.
Os dados da publicação reforçam a importância de adotar uma abordagem combinada no tratamento inicial da meningite, como já recomendado por diretrizes internacionais. Os resultados oferecem uma base concreta para refletir sobre políticas públicas, vigilância microbiológica e estratégias de imunização no Rio de Janeiro e no país.