
Doenças crônicas e outros fatores de risco concentram-se na população brasileira mais pobre.
Enquanto as mortes por coronavírus na Itália alcançavam progressivamente dezenas de milhares, os países da América Latina esperaram apreensivos pelos efeitos que a pandemia traria às suas populações mais vulneráveis. A chegada da doença no continente não foi menos devastadora. Apenas em Guayaquil, maior cidade do Equador, foram notificadas em apenas 15 dias cerca de 6 mil mortes . No entanto, o que se nota neste e em vários outros países emergentes é que a classe social dos pacientes têm se mostrado um fator decisivo no desenvolvimento de casos graves da Covid-19.
Apesar do novo coronavírus ser uma ameaça principalmente para idosos e pessoas com problemas crônicos de saúde, não se fala o suficiente sobre a relação que esses riscos estabelecem com a desigualdade social, característica tão acentuada em países subdesenvolvidos. A exposição da população de baixa renda é mundialmente intensificada por motivos similares, como o uso de transporte público, o número maior de moradores em um mesmo lar, condições de saneamento básico no local habitado e a dificuldade de manter o isolamento social sem perda excessiva de renda ou até mesmo do emprego.
Um estudo realizado pelo Levy Economics Institute, Universidade de São Paulo (USP) e Harvard Medical School levantou claros dados sobre o impacto do abismo social nos pacientes com Covid-19. Na figura abaixo, a pesquisa mostra que os próprios fatores de risco para doença são desigualmente distribuídos na população, de acordo com o nível de escolaridade. Aqueles que declararam ter frequentado apenas o ensino fundamental representam 54% da população mais ameaçada, enquanto os que chegaram ao ensino médio ou superior marcaram 28% e 34% da amostra, respectivamente.

Outros dados levantados pelo estudo também comprovam que a incidência de comorbidades é um fator mais agravante para a Covid-19 do que a idade avançada, por exemplo. E no caso nacional, a incidência de doenças crônicas como hipertensão e diabetes é muito maior entre os brasileiros que só frequentaram o ensino fundamental, totalizando 42% dessa população de risco. A desigualdade é ainda intensificada pelas diferenças entre os sistemas público e privado de saúde no país: o número disponível de leitos é quase cinco vezes inferior para os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), que possuem cerca de um leito para cada 10 mil habitantes.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) segmenta ainda mais a análise das desigualdades sociais do país. Em uma nota técnica publicada este mês, o instituto mostra que dentro da população de baixa renda as mulheres são ainda mais afetadas, pois soma-se às dificuldades citadas a sobrecarga da dupla jornada profissional e doméstica, além de riscos físicos e psicológicos derivados de violência no lar – estatística que está sendo ainda mais expressiva durantes as medidas de isolamento.
O Ipea defende que, para evitar o colapso do sistema de saúde e a progressão acelerada do número de óbitos no Brasil, as medidas desenhadas também devem destinar-se a proteger os mais pobres. Ações como o isolamento voluntário, por exemplo, não serão suficientes sem políticas efetivas de preservação de renda que permitam a adesão das classes mais baixas; enquanto isso, a ampliação do número de leitos públicos segue como empreendimento tanto necessário quanto imperioso durante a ofensiva pandêmica.
Escrito por Maria Eduarda Ledo de Abreu.
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22.04.2020