4 principais doenças cardíacas relacionadas à obesidade
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A obesidade é um dos maiores desafios de saúde pública no Brasil e no mundo. A condição já atinge grande parte da população adulta e está diretamente associada ao risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares.
Em 11 de outubro é celebrado o Dia Nacional de Prevenção da Obesidade, data que reforça a importância da conscientização sobre o impacto da obesidade na saúde e lembra a necessidade de adotar hábitos que previnam complicações graves.
A obesidade não apenas altera o metabolismo, mas também é a causa de várias outras doenças que aumentam o risco cardiovascular a sobrecarregam o coração. Neste texto listamos as 4 principais doenças cardíacas relacionadas à obesidade. Continue lendo e confira.
Como a obesidade afeta o funcionamento do coração?
A obesidade impacta diretamente a saúde do coração. O excesso de gordura faz o coração trabalhar mais, aumentando o volume de sangue e a pressão nas artérias, o que pode causar hipertensão e sobrecarga cardíaca. Mais importante que o peso total é onde a gordura se acumula. O excesso de gordura na região da barriga está fortemente ligado ao risco de insuficiência cardíaca, rigidez dos vasos e problemas de circulação.
No coração, a obesidade pode levar ao acúmulo de gordura no músculo cardíaco, causando alterações que dificultam o bombeamento eficiente do sangue e aumentando o risco de insuficiência cardíaca e arritmias. Além disso, a obesidade pode comprometer os ventrículos e os átrios do coração, piorando a função cardíaca, especialmente em quem tem apneia do sono ou outros problemas respiratórios.
De acordo com a Dra. Luciana Lopes, endocrinologista nos hospitais Copa D’Or e Copa Star, no Rio de Janeiro, esses efeitos fazem parte da “cardiomiopatia da obesidade”. “O conceito de ‘cardiomiopatia da obesidade’ é sustentado por evidências clínicas e experimentais, envolvendo mecanismos como resistência à insulina, lipotoxicidade, disfunção mitocondrial, estresse oxidativo, fibrose miocárdica e comprometimento da microvasculatura coronariana”, explica a especialista.
4 principais doenças cardíacas relacionadas à obesidade
O cardiologista Dr. Israel Marcos de Paula Junior, coordenador da Equipe de Cardiologia do Hospital São Luiz – Alphaville – Rede D’Or, explica que o excesso de gordura aumenta a ativação hormonal e a resistência dos vasos sanguíneos, elevando a pressão e forçando o coração a trabalhar mais para bombear sangue, o que acelera o desgaste cardíaco e pode levar a doenças como hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, doença arterial coronariana e infarto. Além disso, a obesidade também aumenta o risco de fibrilação atrial e morte súbita.
A seguir, conheça as 4 principais doenças cardíacas relacionadas à obesidade:
1.Hipertensão arterial
Dra. Luciana Lopes destaca que a relação entre obesidade e hipertensão arterial é amplamente reconhecida e fundamentada na literatura médica. “A obesidade é um dos principais fatores de risco para hipertensão arterial, sendo responsável por aproximadamente 40% dos casos em mulheres e até 78% em homens, segundo estimativas epidemiológicas de grandes estudos como o Framingham Offspring Study e o Nurses’ Health Study”, aponta.
A obesidade é um determinante central da hipertensão arterial, mediada por mecanismos neuro-hormonais, renais, metabólicos e inflamatórios, pois:
- Faz o corpo reter mais sódio e líquidos;
- Aumenta hormônios que elevam a pressão;
- Provoca inflamação;
- Prejudica o funcionamento dos rins e dos vasos sanguíneos.
- Além disso, a resistência à insulina relacionada à gordura abdominal também dificulta o controle da pressão.
2.Insuficiência cardíaca
“A obesidade é um fator de risco independente e causal para o desenvolvimento de insuficiência cardíaca (IC), inclusive em pessoas jovens. O aumento do índice de massa corporal (IMC) está associado a maior incidência de IC, tanto com fração de ejeção preservada (ICFEp) quanto reduzida (ICFEr), e esse risco é incremental: cada unidade adicional de IMC aumenta significativamente o risco de IC, independentemente de outros fatores como hipertensão, diabetes ou doença coronariana”, descreve Dra. Luciana Lopes.
Mesmo em pessoas jovens, o excesso de peso pode prejudicar o coração. Ele pode causar aumento e alterações no músculo cardíaco, acúmulo de gordura no coração e dificuldades para o órgão bombear sangue corretamente, fatores que aumentam o risco de insuficiência cardíaca precoce.
“Estudos longitudinais mostram que adolescentes com sobrepeso ou obesidade apresentam risco elevado de desenvolver cardiomiopatia e IC na vida adulta, com risco já aumentado em faixas de IMC consideradas normais-altas. Além disso, há evidências de que a ICFEp, tradicionalmente considerada doença de idosos, ocorre também em adultos jovens e até em menores de 55 anos, sendo a obesidade um dos principais determinantes dessa apresentação precoce”, complementa a especialista.
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Os principais sintomas de insuficiência cardíaca relacionados a obesidade incluem:
- Falta de ar (dispneia):pode ocorrer ao realizar esforços físicos, ao deitar-se ou durante a noite, obrigando a pessoa a se sentar para respirar melhor. Esse sintoma pode indicar congestão nos pulmões e início de insuficiência cardíaca.
- Inchaço nos membros inferiores (edema): retenção de líquidos faz com que pernas e pés fiquem inchados, sendo mais intensa em pessoas com excesso de peso devido à maior retenção de líquido e à dificuldade de mobilização do excesso de volume.
- Ganho rápido de peso: aumento súbito do peso corporal pode ser sinal de retenção de líquidos, refletindo sobrecarga do coração.
- Fadiga e intolerância a exercícios: pacientes com obesidade e com IC apresentam pior capacidade funcional, com dificuldade para realizar atividades físicas comuns, com redução do consumo de oxigênio, sensação de fadiga rápida e menor resistência, que podem indicar comprometimento da função cardíaca.
- Desconforto abdominal e sintomas gastrointestinais: sensação de estômago cheio, náuseas ou dor no lado direito do abdômen podem estar relacionados à congestão do fígado e do sistema venoso devido à sobrecarga cardíaca.
- Qualidade de vida prejudicada: o impacto dos sintomas na qualidade de vida é maior em pacientes com obesidade. Limitação para atividades do dia a dia, piora do bem-estar e maior dependência de terceiros podem surgir quando a obesidade afeta o coração.
“A dispneia ao inclinar-se para frente (bendopneia) ocorre em até 30-50% dos pacientes com IC, sendo mais prevalente em indivíduos com obesidade devido ao aumento das pressões de enchimento cardíaco durante a flexão do tronco”, complementa Dra. Luciana.
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3.Doença arterial coronariana
O excesso de gordura no corpo, principalmente a gordura abdominal que fica ao redor dos órgãos, prejudica diretamente as artérias do coração. Ela causa inflamação, altera o colesterol, aumenta a pressão e favorece a formação de placas que podem entupir os vasos. Quanto mais gordura visceral a pessoa tiver, maior o risco de problemas como infarto e outros eventos cardíacos.
“A gordura no corpo, especialmente a abdominal, aumenta o colesterol ruim (LDL) e reduz o colesterol bom (HDL). Isso acelera a formação de placas de gordura nas artérias do coração, que podem se romper e causar um infarto”, explica Dr. Israel Marcos de Paula Junior, que também atua no diagnóstico, tratamento e prevenção das doenças cardiovasculares, com especial interesse em ecocardiografia, cardiologia clínica e procedimentos estruturais.
“O acúmulo de gordura visceral está correlacionado com maior volume e gravidade de placas coronarianas, especialmente placas não calcificadas e de baixa densidade, que apresentam maior risco de eventos cardiovasculares agudos, como infarto do miocárdio. Estudos de imagem demonstram que indivíduos com maior quantidade de gordura visceral apresentam maior carga de ateroma e maior risco de estenose coronariana significativa”, complementa Dra. Luciana.
Em outras palavras, o excesso de gordura abdominal (gordura visceral) está ligado à formação de placas de gordura nas artérias do coração. Quanto mais gordura visceral, maior a quantidade e a gravidade dessas placas, principalmente as mais instáveis, que não estão endurecidas. Essas placas de baixa densidade são perigosas porque podem se romper, causando infarto ou outros problemas graves. Exames de imagem mostram que pessoas com mais gordura abdominal tendem a ter artérias mais obstruídas, aumentando o risco de doenças cardíacas sérias.
Segundo o Dr. Israel Marcos de Paula Junior, são hábitos que podem prevenir a doença arterial coronariana em pessoas com sobrepeso:
- Dieta Mediterrânea ou DASH;
- Atividade física ≥ 150 min/semana;
- Controle de peso e circunferência abdominal;
- Não fumar;
- Controle de pressão, colesterol e glicemia.
4.Infarto
“Pacientes com obesidade apresentam maior risco de infarto do miocárdio devido a uma combinação de mecanismos metabólicos, inflamatórios e hemodinâmicos. As alterações do colesterol relacionas à obesidade são o aumento dos triglicerídeos, a diminuição do HDL colesterol (o colesterol bom), a alteração do LDL (lipoproteína de baixa densidade), que se torna menor e mais denso, aumentando seu potencial aterogênico; e ao aumento de outra lipoproteína aterogênica especialmente o colesterol de muito baixa densidade (VLDL), que explica uma parcela substancial do risco adicional de infarto observado nesses indivíduos, independentemente dos níveis de LDL ou da presença de síndrome metabólica”, descreve Dra. Luciana.
Dr. Israel Marcos de Paula Junior complementa explicando por que pessoas com obesidade têm mais risco de infarto. “A inflamação crônica, dislipidemia e aterosclerose precoce explicam o risco aumentado. O tecido adiposo visceral é metabolicamente ativo, liberando citocinas inflamatórias que instabilizam as placas coronárias”, diz o cardiologista, que também coordena programas de educação e inovação na área médica.
A obesidade aumenta muito o risco de infarto porque causa inflamação, altera o metabolismo e afeta diretamente os vasos e o coração. “Estudos populacionais demonstram que o risco de infarto do miocárdio aumenta progressivamente com o aumento do índice de massa corporal, mesmo na ausência de síndrome metabólica, e que a obesidade central (avaliada por circunferência abdominal ou relação cintura-estatura) é um marcador particularmente forte de risco cardiovascular. Em mulheres, a obesidade pode aumentar o risco de infarto em até quatro vezes em comparação com mulheres com peso adequado”, ressalta a endocrinologista.
Os sinais de infarto agudo do miocárdio que não devem ser ignorados incluem:
- Dor ou pressão no peito maior que 20 minutos;
- Dor irradiada para braço esquerdo, ambos os braços, ombro, pescoço, mandíbula, costas ou dorso;
- Falta de ar;
- Sudorese intensa, náuseas, vômitos, tontura;
- Sensação de fraqueza ou desmaio;
- Palidez cutânea.
“Em diabéticos e idosos falta de ar isolada ou fadiga súbita pode ser o único sintoma”, destaca o cardiologista.
“Em mulheres, idosos e pacientes com diabetes, manifestações atípicas como dor em regiões extratorácicas (mandíbula, pescoço, dorso, epigástrio), fadiga intensa, dispneia isolada, palpitações, indigestão ou mal-estar podem predominar e também não devem ser subestimadas”, complementa Dra. Luciana.
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Doenças cardiovasculares na mulher: sintomas são diferentes
“A presença de qualquer um desses sinais ou sintomas, especialmente em pacientes com fatores de risco cardiovasculares, deve motivar investigação imediata, pois o atraso no diagnóstico e tratamento está associado a pior prognóstico”, alerta a médica.
No eletrocardiograma (ECG), algumas alterações podem indicar que o coração não está recebendo sangue e oxigênio suficientes, o que pode significar um infarto em andamento. Mesmo quando o primeiro exame não mostra alterações, isso não descarta o infarto, por isso muitas vezes é necessário repetir o ECG.
É possível reverter os danos no coração causados pela obesidade?
A reversão do dano cardíaco causado pela obesidade é possível em diversos graus, especialmente quando há perda de peso significativa, seja pelo tratamento clínico (medicações para obesidade) ou por intervenção cirúrgica (como cirurgia bariátrica) associadas sempre as mudanças intensivas no estilo de vida.
O tratamento necessita de acompanhamento regular com equipe multidisciplinar (endocrinologista, cardiologista, nutricionista, educador físico e o cirurgião bariátrico nos pacientes indicados) capacitada, especializada, focando sempre no tratamento individualizado para as necessidades de cada paciente.
“Estudos mostram que perder 5 a 10% do peso corporal já reduz significativamente a pressão arterial, melhora o colesterol e diminui a inflamação, protegendo o coração e até revertendo lesões iniciais das artérias. Além disso, a mudança do estilo de vida e o uso de medicação adequada são fundamentais para a reversão dos danos e em alguns casos a cirurgia bariátrica pode trazer benefícios cardiovasculares significativos”, destaca Dr. Israel.
“O conceito de ‘reverse cardiac remodeling’ está bem estabelecido: após perda significativa de peso, observa-se redução da massa ventricular esquerda, diminuição do volume atrial e melhora da função diastólica, além de normalização da geometria cardíaca em muitos pacientes”, complementa Dra. Luciana Lopes.
Perder peso pode trazer benefícios importantes para o coração. Com a redução da gordura corporal, o coração trabalha com menos esforço, há diminuição da inflamação e melhora no funcionamento do órgão. Em muitos casos, é possível até reverter alterações estruturais e recuperar parte da força do coração.
Essas mudanças ajudam, inclusive, a melhorar o ritmo dos batimentos cardíacos e diminuem o risco de arritmias. Pessoas com insuficiência cardíaca relacionada à obesidade também podem se beneficiar bastante, já que o coração pode recuperar parte da sua força, reduzir de tamanho e funcionar melhor, o que resulta em menos internações e maior qualidade de vida.
No entanto, quando o dano ao coração já está muito avançado, especialmente em casos em que há cicatrizes no músculo cardíaco, a reversão pode não ser completa. “A literatura médica atual sustenta que o dano cardíaco estrutural e funcional causado pela obesidade é, em grande parte, reversível com perda ponderal substancial, especialmente por meio de cirurgia bariátrica, embora a reversão completa dependa do grau e da duração do dano pré-existente”, ressalta Dra. Luciana.
Mudanças no estilo de vida que ajudam a proteger o coração
As mudanças no estilo de vida precisam ser feitas de acordo com a realidade de cada pessoa, levando em conta suas condições de vida e possíveis dificuldades para manter os novos hábitos. Quando adotadas de forma constante, essas mudanças se tornam a base para prevenir e até controlar problemas no coração.
As ações mais eficazes para proteger o coração, de acordo com as principais diretrizes e revisões recentes, incluem:
- Tratar a obesidade como doença crônica: prevenir ou controlar o excesso de peso ajuda a evitar danos no coração.
- Praticar atividade física: ao menos 150 minutos por semana de exercícios moderados, ou 75 minutos semanais de atividade vigorosa já reduzem bastante o risco cardiovascular.
- Seguir uma alimentação saudável: uma dieta rica em frutas, verduras, grãos, peixes e pouco ultraprocessado, sal e açúcar. Padrões alimentares como a dieta Mediterrânea e a DASH demonstram benefícios consistentes na redução do risco cardiovascular.
- Parar de fumar: a cessação do tabagismo é uma das atitudes mais eficazes para proteger o coração.
- Cuidado com o álcool: o consumo excessivo de álcool aumenta o risco de pressão alta e problemas no ritmo cardíaco.
- Dormir bem:o sono de 7 a 9 horas por noite protege contra doenças cardiovasculares.
- Controlar o estresse:técnicas de relaxamento para controlar o estresse e cuidar da saúde mental ajudam a manter o coração saudável.
- Fazer check-ups regulares: acompanhar pressão, colesterol e glicemia através do check-up é fundamental para prevenir complicações.
A obesidade é uma doença crônica e progressiva, que não tem cura, mas pode e deve ser tratada com acompanhamento médico adequado. Cada pessoa precisa de um cuidado individualizado, baseado em evidências científicas. É importante evitar preconceitos e desconfiar de soluções milagrosas sem comprovação.
Cuidar do peso não é apenas uma questão estética, mas uma forma essencial de proteger o coração e garantir qualidade de vida. Se você tem obesidade ou fatores de risco, agende uma consulta com um cardiologista D’Or para avaliar sua saúde cardiovascular e receber orientações.